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Condutas anticoncorrenciais e a Lei do Cade

A lei repete boa parte do elenco exemplificativo de infrações já trazido pela Lei nº 8.884, de 1994, eliminando incisos que caíram em descrédito e outros polêmicos

A Nova Lei de Defesa da Concorrência, Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, traz modificações importantes à dinâmica da repressão das condutas anticompetitivas. Inicia-se com a redução no número de notificações de atos de concentração e a maior eficiência na análise de estruturas, com o que se aguarda maior dedicação, por parte da autoridade concorrencial, à repressão das infrações à ordem econômica.

A lei repete boa parte do elenco exemplificativo de infrações já trazido pela Lei nº 8.884, de 1994, eliminando incisos que caíram em descrédito e outros polêmicos. Contudo, não se deve dizer que as condutas excluídas do rol deixarão de ser investigadas, mesmo porque o rol não é taxativo e a tipologia é aberta. Este é o caso, por exemplo, da imposição de preços excessivos. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) foi palco de recente e interessante debate sobre a avaliação de preços abusivos, concluindo-se, ao final, que os preços excessivos merecem punição e podem ser identificados. Novas condutas foram elencadas, como é o caso da exploração ou exercício abusivo de direitos de propriedade intelectual, uma preocupação recente do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC).

Nos últimos anos, percebeu-se uma especial atenção à persecução de cartéis, mas há ainda muito espaço para a necessária repressão às condutas unilaterais (criação de barreiras à entrada de concorrentes, exclusividade, imposição de preços de revenda, entre outras), talvez tão nefastas quanto os cartéis, sobretudo em setores econômicos concentrados.

No tocante aos cartéis, importante ressaltar os desafios do novo Cade no fortalecimento do programa de leniência no Brasil, amplamente divulgado e incentivado pelas gestões anteriores, mas ainda eivado de incertezas. A lei permite - uma novidade - que os líderes dos cartéis sejam os lenientes e merecedores do benefício da isenção de penalidade administrativa e criminal. Deve-se atentar para que isso não signifique que empresas vejam os cartéis e as posteriores leniências como formas inteligentes de prejudicar concorrentes diretos e para que as autoridades saibam identificar e punir estas formas de litigância vexatória (sham litigation).

Sobre os cartéis, não se pode atribuir toda a responsabilidade ao novo Cade
Ainda sobre os cartéis, não se pode atribuir toda a responsabilidade ao novo Cade. O Ministério Público - Federal e Estadual - tem papel importante nesse enredo e a comunicação entre os órgãos será fundamental para evitar procedimentos colidentes.

A respeito das novas sanções administrativas trazidas pela lei, prevaleceu um percentual mais baixo de multa (0,1% a 20% do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração) e uma definição incerta de ramo de atividade como base de cálculo para a penalidade. Não se advoga pela aplicação de sanções mais brandas que só sirvam de incentivo para a prática de atos ilícitos. Advoga-se pela segurança necessária que gere alguma certeza ao administrado sob investigação e à própria autoridade para aplicar a multa. Critérios como o Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), proposto como um balizador do "ramo de atividade", devem ser aplicados com a parcimônia suficiente para tentar, dentro do possível, obedecer a vontade do legislador e as boas regras de hermenêutica jurídica.

Outra novidade é que a Superintendência-Geral integrará o Cade, ou seja, está na mesma estrutura do tribunal. Porém, a Superintendência-Geral e o tribunal têm funções diferentes e independentes. Caberá à Superintendência investigar as violações concorrenciais e ao tribunal a revisão das investigações e a decisão.

A lei ainda dispõe que os atos de concentração terão prioridade sobre o julgamento das condutas anticoncorrenciais. Alerta-se, contudo, que tão importante quanto, ou mais, que a análise prévia de uma concentração é o julgamento célere de um processo que condenará ou absolverá uma suposta infração à ordem econômica.

Enfim, novos tempos se avizinham. Não há como ser pessimista diante de uma lei pela qual se esperava há quase dez anos. Diálogo, compreensão, certa dose de flexibilidade e paciência serão necessários pelas partes: empresas, advogados, economistas e autoridades. Há muito a se construir, mas agora já com alguma vitoriosa experiência.

Vicente Bagnoli e Leonor Cordovil são, respectivamente, professor adjunto da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, membro da Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica da OAB-SP, conselheiro do Ibrac e advogado; professora de direito econômico e do consumidor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, GVLaw, diretora do Ibrac e advogada