Para o Direito, o documento é a prova, "a maior das provas", pois é "consistente da representação fática do acontecido" (BRASIL, 2000). Mas, se virmos pelo prisma do documento-registro, o documento eletrônico é juridicamente correto, pois "como uma seqüência de bits ele pode ser traduzido por meio de programas de informática, que vai revelar o pensamento e a vontade de quem o formulou" (BRASIL, op.cit.). Ou seja, é um registro ágil de atividades e relações que precisam ser cada vez mais rápidas. E como as relações rápidas necessitam de registros e de provas destas atividades, o paradigma do documento eletrônico não se resume ao reconhecimento da autoria. Outros questionamentos, como quais as transações virtuais representam atos jurídicos, necessitando, dessa forma, de comprovação de autoria. Uma conta de e-mail, por exemplo, não é um ato jurídico, dessa não necessita de maior comprovação de origem (MENKE, 2005, p. 37).
De acordo com Ricardo Lorenzetti (apud CASTRO), o documento eletrônico não tem prejudicado o seu valor probatório, pois atua como registro, e aponta como principal barreira à aceitação jurídica deste documento a insegurança quanto à atribuição da autoria. Para essa incerteza da autoria, há regras em determinados setores da sociedade, que já estabelecem requisitos de assinatura eletrônica, que é ainda o principal meio de identificação de criador do documento eletrônico.
Constitui prova, segundo o Código Civil de 2002, o documento público em que seja reconhecido a data e o local de sua realização, a identidade das partes envolvidas e, é parte deste documento probatório, a assinatura das partes (BRASIL, 2002, Art. 215).
No caso dos contratos de compra e venda, como os contratos de comércio eletrônico, é facultada às partes a elaboração de contratos atípicos. No entanto, temos duas pessoas necessárias para a produção de um contrato: um contratado e um contratante. O contratado, ou fornecedor, é responsável pela entrega do produto ou serviço que é objeto de um contrato. O contratante, ou consumidor, é o destinatário do produto ou serviço.
Ao falarmos da relação Consumidor/Fornecedor ou Contratante/Contratado, a garantia dada pelo Código Civil é de que as cláusulas ambíguas serão sempre interpretadas favoravelmente ao contratante. No Código de Defesa do Consumidor, no Art. 47, é expresso que as "cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor". O cliente sempre tem razão, segundo a legislação brasileira, inclusive nos contratos de comércio eletrônicos.
Nessa relação, o Código Civil já garante a compra através de outros meios, além da relação direta Consumidor/Fornecedor. Uma vez que o consumidor, como a pessoa presente, pode também ser aquele que "contrata por telefone ou meio de comunicação semelhante" (BRASIL, 2002, Art. 428, Par. I).
A Comissão da Organização das Nações Unidas para Direito Comercial Internacional (United Nations Comission on International Trade Law-UNCITRAL) aprovou em Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas em dezembro de 2001 a Lei Modelo de Assinatura Eletrônica, abrangendo transações comerciais em meio eletrônico, geradoras de contrato ou não.
Juntamente com a Lei Modelo, a Comissão emitiu um guia para adaptação às normas jurídicas locais, de cada país, como, por exemplo, não aplicar a assinatura eletrônica para determinados tipos de atividades comerciais. A incorporação da Lei Modelo por parte de um país independe de notificação da Organização das Nações Unidas; alguns dispositivos da Lei podem ser adotados, sendo a Lei Modelo mais flexível do que uma convenção (MENKE, 2005: 89).
A Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileiras foi implementada em 2001, para a garantia de autenticidade, integridade e validade jurídica dos documentos eletrônicos (MP 2200-2, 2001: Art.1°), após outras tentativas em dadas atividades do governo federal.
A MP 2200-2/2001, instituiu a ICP e também "versa sobre os efeitos jurídicos" produzidos pelo documento, "uma declaração de vontade assinada com um certificado ICP-Brasil" (MENKE, op. Cit., 99). Ao conceder ao Estado o controle e supervisão das emissões e revogações de certificados, é garantido o caráter público dessas informações.
Os certificados expedidos de acordo com essa infra-estrutura são fornecidos pela Autoridade Certificadora Raiz (AC Raiz), primeira autoridade de certificação que tem, entre outras atividades, a prerrogativa de credenciar as Autoridades Certificadoras (AC). Essa AC Raiz é o próprio Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), autarquia subordinada à Casa Civil, e órgão fiscalizador das AC.
A Autoridade Certificadora é a entidade pública ou privada, credenciada pelo ITI, para emissão e revogação de certificados digitais. Essa AC tem a obrigação de disponibilizar ao público a lista de certificados revogados. Os certificados fornecidos pelas AC têm validade definida, com datas de início e fim, mas, em casos de comprometimento da segurança da informação, podem ser revogados. E são essas listas de certificados sem validade, revogados, as disponibilizadas pelas AC.
Como na Lei Modelo da UNCITRAL, temos o papel do relying party ou a pessoa que recebe - e aceita, a partir da conferência do certificado- a mensagem assinada digitalmente.
É interessante ressaltar que, para emitir certificados, a AC não é obrigatoriamente credenciada pela AC Raiz. Nesse caso, prevalece a relação de confiança, onde o receptor (relying party) reconhece como válido a assinatura. Ou seja, se de um lado temos uma instituição reconhecida publicamente, a AC reconhecida pelo ITI, na relação de AC não credenciada prevalece a "boa fé".
A terceira entidade estabelecida na MP 2200-2 é a Autoridade Registradora (AR), a entidade que "opera na ponta inferior da cadeia, aquela que atinge o usuário final" (MENKE, op. Cit., 117), ou seja, o usuário solicita à AR o certificado digital e essa AR encaminha a solicitação à AC a qual está vinculada. É a entidade operacional, que atua presencialmente junto ao usuário, conforme o Art. 7º da MP 2200-2.
Menke destaca que essa entidade inexistia na primeira versão da MP 2200, só vindo a constar na MP 2200-1, de 27 de julho de 2001, onde foi constatada a necessidade de contato presencial na emissão de certificados, devido a críticas de especialistas, que consideraram o sistema vulnerável (MENKE, op.cit. 119). Outro especialista, citado pelo autor, ressalta a necessidade de identificação das partes, para reduzir os riscos de fraudes. Mesmo assim, a "identificação das partes é um procedimento de alto risco em qualquer tipo de negócio" (VOLPI NETO apud MENKE, 2005, 118).
A presença da AR reforça a confiança em um instrumento que pretende garantir a autenticidade e confiabilidade no documento eletrônico. A assinatura eletrônica, tanto como no caso da Lei Modelo da UNCITRAL, como no exemplo da ICP Brasil, parece suprimir a desconfiança no documento eletrônico, pelo simples fato de existir no documento.
Como vimos a assinatura eletrônica, pela criptografia assimétrica e pela divulgação de certos dados, pode ser considerada um meio seguro de identificação de autoria e proteção de dados. Mas, além disso, as transações virtuais são cada vez mais comuns, e essa tendência deve continuar até atividades de maior risco ou mais complexas.
Além da autoria, devemos considerar a comprovação do trâmite, e, como já citado, a abrangência das atividades contempladas pelo meio. Novos subsídios de reconhecimento e confiabilidade devem ser adotados, e se devem adotar também novos conceitos de documento, não excluindo o documento tal como o conhecemos.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n° 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Dispõe sobre o novo Código Civil e dá outras providências. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2002.
BRASIL. Lei n° 8708 de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.
BRASIL, Angela Bittencourt. Assinatura digital. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 40, mar. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1782.
CASTRO, Aldemario Araujo. O documento eletrônico e a assinatura digital. Uma visão geral. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 54, fev. 2002. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2632.
MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos Via Internet. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2003.
MENKE, Fabiano. Assinatura Eletrônica no Direito Brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
UNCITRAL. Model Law on electronic Signatures with Guide to Enactment. Nova Iorque: 2002. Disponível em: http://www.uncitral.org/pdf/english/texts/electcom/ml-elecsig-e.pdf .