Com a edição da Lei nº 11.638/07, que alterou as disposições relativas à elaboração e divulgação das demonstrações contábeis, aproximando-nos das normas internacionais de contabilidade (IFRS), desde 2008, a escrita contábil da maioria das grandes empresas brasileiras foi fortemente impactada.
Com base na extensão de tais mudanças, no ano de 2009, foi editada a Lei nº 11.941 que introduziu o Regime Tributário de Transição - RTT, com o propósito de neutralizar, do ponto de vista fiscal, os impactos trazidos por essas normas na apuração e arrecadação tributária das empresas. A princípio, como o próprio nome já indica, esse regime deveria ser transitório...
Este diploma legal também dispôs que o RTT vigeria até a entrada em vigor de uma nova lei (ainda não editada) que disciplinasse definitivamente os efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis (padrão IFRS).
O RTT, quando surgiu, era optativo para os anos de 2008 e 2009 e obrigatório a partir de 2010, existindo o compromisso de que a Receita Federal criasse algum mecanismo de controle, mesmo em caráter transitório, para abrigar os ajustes contábeis relacionados com a convergência das normas contábeis, neutralizando seus efeitos tributários.
O mecanismo escolhido pela Receita foi o Controle Fiscal Contábil de Transição - FCONT, introduzido pela Instrução Normativa nº 949/09.
Ultimamente, a autoridade fiscal brasileira vem se mostrando bastante preocupada com a perpetuidade desse regime fiscal. Considerando que existe vinculação das regras contábeis vigentes até 31/12/2007 (marco temporal para entrada das "novas regras internacionais") a autarquia entende que com o passar do tempo pode-se perder de vista as regras contábeis que existiam antes desta data, o que geraria um descontrole para fins de determinação das apurações fiscais.
Assim, ao longo dos últimos anos, a Receita Federal vem estudando alternativas para implementação de uma solução definitiva para tributação das empresas.
No âmbito das obrigações acessórias que visam controlar os possíveis ajustes em função das novas normas contábeis, inicialmente (dezembro de 2009), a opção idealizada pela Receita foi manifestada pela Instrução Normativa nº 989, que instituiu o Livro Eletrônico de Escrituração e Apuração do Imposto sobre a Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido da Pessoa Jurídica Tributada pelo Lucro Real (e-LALUR), que, dentre os lançamentos obrigatórios, dispunha pela inclusão dos registros constantes no FCONT.
Entretanto, o e-LALUR já teve postergado o início de sua obrigatoriedade por duas vezes, tendo, atualmente, prevista a entrega do arquivo relativo ao ano-calendário de 2013 para 2014. Essas mudanças evidenciam as incertezas pelo modelo originalmente escolhido.
Neste contexto, outra alternativa aventada pela autarquia foi a instituição do Livro de Ajuste da Convergência - LAC, onde, a partir do resultado auferido proveniente da utilização das novas regras contábeis, seriam efetuados ajustes referentes aos lançamentos diferentes daqueles das regras vigentes até 31/12/2007.
Conforme informações prestadas pela própria Receita no seminário "IFRS - Aspectos Contábeis e Tributários - Visão da Receita Federal" realizada em São Paulo no dia 20/01/2012, a opção pelo LAC em detrimento ao e-LALUR decorre dos seguintes principais fatores:
"1) porque haveria o risco de ofensa aos princípios da legalidade e anterioridade em matéria tributária, na medida em que a apuração do lucro líquido (societário) - ponto de partida para a apuração do IRPJ e da CSLL - estaria sujeita à observância dos pronunciamentos emitidos pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis - CPC (que consistem em atos infralegais); e
2) porque o e-LALUR não seria capaz de garantir a rastreabilidade das operações."
É válido comentar que algumas das principais entidades representativas dos grandes contribuintes (ABRASCA, ANBINA, AMCHAM, ANFAVEA, CNI e FEBRABAN), conforme correspondência enviada à Receita Federal em 27/02/2012, já se manifestaram contrários à utilização do LAC e favoráveis ao e-LALUR, sob os seguintes argumentos:
"(i) a adoção do e-LALUR vai ao encontro da premissa do Projeto SPED de redução do "custo Brasil", respeitando, ainda, o princípio da legalidade em matéria tributária;
(ii) o nível de ajustes e controles a serem feitos no e-LALUR seria sensivelmente menor do que os possíveis ajustes a serem exigidos pelo LAC;
(iii) a realização de registros em livros auxiliares e extracontábeis, para evidenciar os ajustes e controles de interesse particular do fisco, constitui em prática bem sucedida, nascida com o DL 1.598/77 e que já conta com larga experiência em seu uso, tanto por parte do fisco como por parte dos contribuintes. Como exemplo, vale citar os ajustes relativos à provisão para créditos de liquidação duvidosa para instituições financeiras e os ajustes relativos à Circular 3.068/01, do Banco Central do Brasil, que trata da "Marcação de Títulos a Mercado - MTM";
(iv) a adoção do e-LALUR contribuiria para a manutenção do processo de construção coletiva da legislação tributária (tal qual ocorreu no âmbito do Projeto SPED), o que contribui para a diminuição das incertezas e a redução do risco de litígios entre fisco e contribuintes, reduzindo o volume de trabalho do Judiciário e diminuindo o "custo Brasil";
(v) as premissas do Projeto SPED, no qual está incluído o e-LALUR, contemplam justamente a eliminação da redundância de informações existentes na escrituração contábil, no LALUR e na DIPJ, facilitando o cumprimento das obrigações acessórias pelos contribuintes."
Ou seja, estamos vivenciando um momento de intensos debates, sendo que a única certeza existente é que novas mudanças ocorrerão na forma de controlar os ajustes trazidos pela implementação das novas regras contábeis ao padrão internacional.
O fato é que o contribuinte, mais uma vez, será fortemente impactado. Independentemente de ser o e-LALUR (já existente) ou do LAC (em estudo e com forte tendência para implementação) caberá às empresas o ônus de ter que cumprir mais estas obrigações acessórias, sob risco de sofrerem pesadas penalidades.
Não é demais dizer que qualquer uma destas obrigações demandará das empresas investimentos em controles, processos, sistemas e pessoas para adequar sua atual situação contábil e fiscal a este novo cenário.