Com índices de acidente na construção civil altos e locais com péssimas condições de trabalho, má alimentação e longas jornadas, o que caracteriza escravidão contemporânea, o Qatar, país escolhido pela FIFA para sediar os jogos da Copa de 2022, é, na minha opinião, uma péssima opção.
Além de todos os problemas questionados pela imprensa e pela opinião pública, como a mudança do período do evento devido ao forte calor que faz neste país nos meses de junho e julho e a falta de estrutura, o pior de todos é massiva imigração de asiáticos e africanos para trabalhar na construção civil.
Segundo os indicadores atuais, para cada jogo realizado na Copa do Mundo em 2022, no Qatar, 82 pessoas terão morrido durante a construção da infraestrutura do evento. Um saldo de cerca de 600 mortes ao todo.
A HSE Europe (Organização de Saúde, Segurança e Meio Ambiente Europeia), que congrega 37 países europeus e a Turquia, está exigindo a paralização imediata das obras e solicitando retorno dos engenheiros e demais profissionais da área para seus países de origem para, assim, pressionarem a FIFA em função das condições subumanas de trabalho da mão de obra menos qualificada e o alto índices de acidentes do trabalho, muitas vezes seguidos de mortes.
Até pouco tempo atrás, o pequeno país dos Emirados Árabes com população inferior a 2 milhões de habitantes ainda era pouco conhecido. Porém, a partir do momento que passou a pleitear ser o país sede da Copa do Mundo de 2022 as coisas mudaram, principalmente quando o fato se concretizou. O mundo passou a conhecê-lo. Atualmente, é um dos países mais ricos do mundo em função de suas reservas de petróleo.
No entanto, o país não tem infraestrutura para sediar um evento desta proporção. Estima-se que serão necessários 1,5 milhão de imigrantes para construí-la.
Somado a isso, somente 25% da população é catariana, os demais são imigrantes que se instalaram país. A mão de obra da construção civil, formada de imigrantes, não usufrui da mesma legislação e benefícios dos nativos.
Na véspera da reeleição do presidente da FIFA, que aconteceu em 29 de maio, a imprensa criticou severamente o trabalho escravo e alto índice de mortes na construção civil do país. A imprensa tem razão, visto que o que está acontecendo não é nenhuma novidade, sem falar que tais situações foram levantadas antecipadamente.
Vale ressaltar que diante das prisões de dirigentes da FIFA em 27 de maio, Joseph Blatter renunciou quatro dias após ser reeleito em 29 de maio, mas está em período de transição. Uma nova eleição deve acontecer em dezembro deste ano.
Alguns vão falar que é possível criar uma nova legislação rapidamente, especialmente no Qatar, um emirado absolutista e hereditário comandado pela Casa de Thani desde meados do século XIX. Porém, como implantar e adequar novas leis em tão pouco tempo. A mudança de mentalidade e comportamento não se fazem da noite para o dia.
O fato é que a Copa do Mundo é o maior evento esportivo do planeta e estima-se que em sua abertura, em 22 de novembro de 2022, metade da população do estará ligada para ver o espetáculo de abertura, que como sempre será grandioso.
A visibilidade buscada pelo Qatar será alcançada, mas algumas dúvidas ficam no ar: será que empresas mundialmente conhecidas que patrocinam os jogadores e as seleções vão querer ver seus nomes vinculados a tantas mortes e ao trabalho escravo?
Será que o Qatar aproveitará esta oportunidade para melhorar a qualidade de vida da sua população, incluindo a maioria composta de imigrantes, amenizar as proibições e ocidentalizar mais o país?
Toda esta situação do Qatar sempre foi encoberta pela única mídia impressa e falada do país, que pertence ao Grupo Al Jazeera. Com esta abertura, agora terão que começar a conviver com as regras do ocidente, inclusive mídia global. Uma ótima oportunidade para que o mundo conteste estas condições absurdas de trabalho.
A Fifa que tome alguma atitude e melhore a qualidade de vida e as condições de trabalho destes imigrantes, Caso contrário, a copa de 2022 ficará marcada como o maior erro do século.
Marcia Ramazzini é engenheira civil pela PUC Campinas, engenheira em segurança do trabalho e meio ambiente pela Unicamp e mestre em Saúde Ocupacional também pela Unicamp. Tem especializações em riscos industriais e Construção Civil pela OSHA (Occupational Safety Health Administration), Ministério do Trabalho dos Estados Unidos. Marcia é diretora da Ramazzini Engenharia e tem 20 anos de experiência de mercado.