A Lei 12.249/2010, art. 76, incluiu no art. 6º do Decreto-Lei 9.295/46, o direito de o Conselho Federal de Contabilidade editar Normas Brasileiras de Contabilidade de natureza técnica e profissional.
Para os profissionais contábeis, a questão mais premente neste momento é o que se entende por “editar normas”, já que o Conselho Federal vem extrapolando os limites da lei, e, em vez de “editar normas”, tem criado obrigações profissionais.
O poder de “editar normas” é prerrogativa conferida à Administração Pública (no caso, o Conselho Federal de Contabilidade) para publicar atos gerais a fim de complementar as leis, possibilitando a sua efetiva aplicação. Seu alcance é apenas de norma complementar à lei. Não pode o Conselho Federal de Contabilidade alterar qualquer legislação a pretexto de regulamentá-la. Caso isto aconteça, estará cometendo abuso de poder regulamentar e invadindo a competência do Poder Legislativo. O poder regulamentar é de natureza derivada ou secundária, e, portanto, somente exercido à luz de lei preexistente. Já as leis constituem atos de natureza originária ou primária, emanando diretamente da Constituição. Conforme estabelece o art. 5º do inciso II da Constituição, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
O Conselho Federal, sob o pretexto de editar normas contábeis, como já dissemos, cria, de forma ilegal, obrigações profissionais, exigências que, sem base legal, acabam sendo ignoradas pelos órgãos aos quais se destinam, e, inclusive, pelos próprios profissionais contábeis. O descumprimento destas normas acaba por desmoralizar a própria entidade de fiscalização profissional. Isso acontece porque o foco da entidade não é aprovar resoluções sadias, mas justificar os gastos com seus conselheiros e convidados, com viagens e estadias (nacionais e internacionais), argumentando que são necessários à execução dessas normas.
A forma encontrada para mascarar a ilegalidade da norma é argumentar que ela foi aprovada por “audiência pública”, como se este procedimento pudesse legitimar aquilo que é ilegítimo.
Eis um exemplo de como isso funciona: O Conselho leva para a audiência pública uma resolução para tratar da contabilidade das pequenas e médias empresas, obrigando-as a obedecerem normas aplicadas em outros países (IFRS). São normas cujo conteúdo é ilegal, pois instituem obrigações não estabelecidas nas leis brasileiras; normas que confundem os profissionais e que deixam as informações contábeis sem base legal de sustentação, facilitando a manipulação dos resultados econômicos, financeiros e patrimoniais. Este mesmo procedimento é utilizado para tentar legitimar o exame dos peritos, dos auditores, e etc.
O Conselho Federal de Contabilidade deveria deixar de lado esta ideia fixa de editar resoluções e começar a se preocupar mais com a profissão, instituindo mecanismos de controle profissional, combatendo o ensino contábil desqualificado. Além disso, os conselhos regionais precisam ser mais atuantes para evitar os abusos do Conselho Federal, que vem aprovando resoluções sem a participação daqueles. Afinal, conforme a Lei 11.160/2005, o CFC deve ser constituído por um representante efetivo de cada Conselho Regional; e já está na hora de esta exigência começar a ser cumprida.
Salézio Dagostim é contador; pesquisador contábil; professor da Escola Brasileira de Contabilidade (EBRACON); autor de livros de Contabilidade; presidente da Associação de Proteção aos Profissionais Contábeis do Rio Grande do Sul - APROCON CONTÁBIL-RS; presidente da Confederação dos Profissionais Contábeis do Brasil - APROCON BRASIL; e sócio do escritório contábil estabelecido em Porto Alegre (RS), Dagostim Contadores Associados, à rua Dr. Barros Cassal, 33, 11º andar - salezio@dagostim.com.br.