Houve momento em nossa história do reinado dos economistas, públicos e privados, administradores, e o predomínio do que se denominava técnico-burocracia. O direito foi lançado a uma disciplina de segunda categoria, o que se vê da demanda dos cursos universitários. Lembro-me de uma mãe que deu um conselho a uma filha que terminou presa e tudo o mais pelo governo militar: "minha filha, deixe disso, case-se com alguém, mesmo que seja um estudante de direito". Hoje, o fenômeno está invertido: a procura pelas boas faculdades públicas do ramo jurídico quase se emparelha ao campo da medicina. Porque as razões jurídicas mandam no País e as demais obedecem, como não poderia ser diferente.
Nos debates eleitorais, nada, absolutamente nada, se falava sobre a Justiça e seu funcionamento, o que era bom para uma incorreta autonomia absoluta de juízes e tribunais, menos solicitados e mais severos e discricionários, em limites menos amplos de seus atos de decidir.
Hoje, quem manda é o juiz. Descrevemos um fato incontestável, não um juízo de valor. O Senado da República acabou de transformar-se num Tribunal, temporário e legítimo, porque placitado pela Constituição da República. Ainda recentemente, as luzes dos carros nas estradas podem vir a ser apagadas, por decisão de uma Juíza do Distrito Federal. À primeira vista, também esteve presente, na decisão judicial, sua razão axiológica, porquanto mais importante é a sinalização adequada de todas as rodovias nacionais, providência pública, como muitas outras, abandonada ao Deus dará.
Benefícios previdenciários são recontados por fóruns previdenciários, o que é uma vergonha para o País. O Instituto não teria condições de calcular com honestidade os benefícios da Previdência, cujos servidores se supõe altamente especializados e cuja atividade-meio consome mais recursos que a atividade-fim, o pagamento das prestações, sem que ninguém toque no assunto, ao falar de reforma da Previdência?
Por que razão as agências controladoras de atividades delegadas pelo Estado não exercem suas precípuas funções, o controle de qualidade e as cobranças do preço dos serviços, obrigando milhões de consumidores brasileiros a procurar o Judiciário, com demandas que não deveriam assoberbá-lo?
Conclui-se que faliu a administração direta e indireta brasileira. Ao judiciário cabe com constância a tarefa de realizar o justo e o jurídico, como sempre fez nas relações privadas. Ganhou corpo o direito público, para salvaguarda, pelo Judiciário, das liberdades públicas negativas (intromissão indevida de um estado monstruoso em nossas órbitas privadas) e positivas (realização das atividades obrigatórias não cumpridas pelo Estado).
Nesta quadra, sabemos que a proatividade da Justiça é um mal, mas necessário, em favor de nosso mais importante mandante (o povo). Como se explicar a quantidade imensa de leis declaradas inconstitucionais pela Suprema Corte, face a tantas comissões especializadas do Congresso Nacional e seus servidores remunerados no limite dos vencimentos dos ministros do STF? Ao procurar, juntamente com diretores de uma Confederação Sindical, no governo Dilma, a Casa Civil, para que fosse vetado um contrabando legislativo, os chamados jabutis, ouviu-se a resposta: "sabemos, mas terá de ser como está". Posteriormente, os jabutis foram considerados inconstitucionais pelo Plenário do Pretório Excelso, encerrando-se essa prática criminosa na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, mas os atos anteriores ao julgamento, em grande parte responsáveis pela corrupção em nosso País, foram mantidos (efeitos somente futuros das decisões do Supremo Tribunal, "ex nunc"). Ora, a maioria dos julgamentos incidem sobre fatos passados. Não fosse assim, o que seria das teorias das nulidades e das anulabilidades?
Retornemos ao título, porque o tema é oceânico. Quando nos falarem de uma nova norma, como a dos faróis acesos, tenhamos resposta pronta. "Há controvérsias. O que disse a Justiça?".
Amadeu Roberto Garrido de Paula, advogado e poeta. Autor do livro Universo Invisível e membro da Academia Latino-Americana de Ciências Humanas.
Esse texto está livre para publicação. Se precisar de mais informações ou quiser agendar uma entrevista com Amadeu Garrido de Paula entre em contato na De León Comunicações, nos telefones (11) 5017-4090//7604// 99655-2340 ou e-mail bruna@deleon.com.br.