Resumo:
Apresentamos uma breve apreciação sobre o dever do perito de realizar a “análise científica”, por força do inciso II do art. 473 do CPC/2015, na validade da aplicação da literatura contábil, em uma situação pericial, “litígio específico, ou seja, em um caso em concreto”.
E para tal, questiona-se, se essa atividade de verificação da aplicação de uma ou mais doutrinas, como ordem fundamental de uma análise científica, maneira lógica difusa; é inerente ou não, às atividades desenvolvidas nos laboratórios de perícia contábil forense-arbitral, da qual espera-se que os peritos não irão esquivar-se, no que diz respeito à apreciação de sua aplicação, nos elementos inspecionados à luz da ciência.
E com este referente vamos estudar a função científica, interpretativa de um perito, no que diz respeito à aplicação da equidade como critério de justiça e, como lastro dos laudos periciais.
Palavras-chave: #Lógica racional difusa. #Perícia contábil. #Doutrina. #Análise científica.
Justifica-se esta abordagem pela necessidade de um espancamento e clarificação científica das questões periciais que envolvem a apreciação do conteúdo das doutrinas.
Esta pesquisa tem amparo na denominada, lógica racional difusa, a qual será empregada em situações onde os problemas admitem uma solução doutrinária, entre várias opções, teses e antíteses.
A lógica racional difusa é indicada sempre que existir um grande número de variáveis, doutrinas, que influenciam em uma perícia, em especial, é possível esta inferência, quando a questão envolve a teoria do valor, a teoria da essência sobre a forma, e a teoria pura da contabilidade, e nos procedimentos e critérios de valorimetrias, derivadas de diferentes métricas contábeis, oriundas de diferentes literaturas. Motivo pelo qual, a análise científica[1], deverá ser utilizada para determinar a melhor alternativa doutrinária dentro deste sistema de lógica racional difusa.
Atualmente o labor dos peritos em seus laboratórios de perícias contábeis forense-arbitral, se dedicam a dois tipos de análises, ou em áreas de especialidades, a análise técnica e a análise científica, observando os termos do inciso II do art. 473 do CPC/2015.
E a doutrina é um referente, ou meio de auto integração, da ciência com um caso em estudo, pois fornece um ou vários critérios para a solução de um ponto técnico ou científico controvertido.
Não existe dúvida, que, para se reforçar uma argumentação científica, o perito deve recorrer à doutrina. Até porque, o CPC/2015, no art. 156 revela que o juiz será assistido por um perito, quando a prova de um fato depender de conhecimento científico.
Sempre que um perito tenha alguma incerteza em suas pesquisas, poderá recorrer a regras, da lógica racional difusa, a qual se apresenta como uma alternativa de solução, uma vez que é possível ao perito, desenvolver uma análise de dados que agrupe os critérios mais representativos, para uma tomada de decisão, quanto à seleção da melhor doutrina, ou métrica contábil, a ser adotada em um determinado litígio, com características específicas.
Este modelo, análise de dados que agrupa os critérios mais representativos, poderá orientar o perito, pois está fundamentado num procedimento científico baseado nos princípios da “lógica difusa[2]” de maneira tal que consegue avaliar os diversos parâmetros, fundamentações ou métricas contábeis, que influem na solução de um caso em concreto. Exemplificando, na coleta de dados para a precificação do fundo de comércio, podem ser válidos, para fins do lucro da operação: a média, a mediana, a mostra, e a amostra superlativa.
Um perito que não enfrentar uma questão doutrinária, claudica frente a uma questão científica, pois pela via da analogia, é o mesmo que um juiz deixar de decidir uma lide, frente a uma lacuna na lei, violando o art. 140 do CPC/2015.
Com o uso de um modelo de análise de dados e premissas, o profissional poderá, com base no ceticismo, eleger e adotar uma doutrina, entre as alternativas existentes, que permite ao experto chegar a uma proposta mais racional, do ponto de vista científico. Para a escolha e validação de uma doutrina a um caso em específico, será necessário sua testabilidade, para se obter uma asseguração contábil que possa estabelecer e analisar os aspectos relevantes e multivalorados de cada uma das doutrinas apreciadas, e constantes da tese e da antítese, em relação ao sistema de equidade a ser adotado.
O sistema de lógica difusa aplicado, no âmbito da perícia contábil, para a escolha de uma alternativa mais equitativa, toma-se válido, na medida em que: aprecia o valor das verdades, pelo viés científico defendido pelo autor e também pelo viés científico contraposto pelo réu, pois, uma solução pode estar compreendida entre aquilo que é completamente verdadeiro e aquilo que é completamente falso, e o que é defensável, como uma base da compreensão científica-filosófica, mediante um juízo de ponderações. Isto sem embargos à lógica aristotélica, a qual defende que existem apenas dois possíveis valores ("verdadeiro" e "falso") para cada proposição.
As implementações da lógica difusa no âmbito de um laboratório de perícia contábil forense-arbitral, permitem, que as situações doutrinárias controvertidas, observados por um modelo de análise de dados e premissas, possam, pelo perito, serem tratadas por dispositivos de controle, que o levam a compreender a realidade conforme esta é, e não conforme um litigante gostaria que fosse. Desse modo, é possível avaliar conceitos; teorias com seus teoremas e princípios; e métricas, como casos práticos onde um perito deve avaliar procedimentos e modelos científicos, para a mensuração de: haveres, indenizações, lucro cessante, fundo de comércio, ou a veracidade de um argumento científico que instrui uma ação, como uma prova pré-constituída, cuja avaliação pode ser: correto, incoerente, falso, ou outro diagnóstico intermediário.
Não olvidamos que seja possível uma opinião de resistência ao uso da lógica difusa multivalorada, que defendemos nos trabalhos periciais, pari passo com o enfrentamento das questões doutrinárias, no exame das provas, pois todos os peritos pesquisadores, devem ter humildade científica para respeitar a opinião dos colegas, sem que com isto, venham a concordar com elas. Esta opinião, quiçá de alguns peritos, de resistência ao uso da lógica difusa pelos especialistas em seus laboratórios, pode ser associada a diferentes fatores, entre eles, uma diferença substancial de ideologia, e o fato de que é possível, a criação de falácias ou paralogismos doutrinários, na sustentação da peça vestibular, assim como, no contra pedido.
Lembramos que muitos modelos de solução das questões de antinomias doutrinárias, permitem soluções aproximadas, que não correspondem a uma "verdade" lógica, tal como a lógica de Aristóteles, onde uma proposição, somente pode ser falsa (0) ou verdadeira (1), não admitindo-se que exista duas coisas verdadeiras ou falsas ao mesmo tempo, enquanto que para a lógica difusa de Lotfi A. Zadeh, existe inúmeros possibilidades de números entre (0) e (1) que podem ser verdadeiros, logo, presente a multivaloração.
Defendemos que essa atividade de verificação da ordem doutrinária, de maneira difusa é inerente à atividade pericial, da qual o perito não se esquiva do dever de avaliar (analisar e interpretar as doutrinas).
A análise do laudo pericial pode levar a questionamento ou impugnações. É o direito dos litigantes de contradizer, lastreado na ampla de defesa e no contraditório, que sempre surgirão como uma questão de direito vinculada ao mérito.
Definida a natureza da análise científica do perito, resta o tema específico do presente estudo, o perito tem ou não o dever ou a faculdade de se manifestar em relação às questões doutrinárias, mesmo com a hipótese de uma fundamentação no princípio da epiqueia contabilística, com o qual os peritos deliberarão de acordo com o que lhes pareça mais justo, provável, razoável e proporcional.
Os adeptos dessa corrente, da lógica difusa em um raciocínio multivalorado, no âmbito da perícia contábil, fundamentam sua adesão no sentido de que os peritos de fato e de direito deve iluminar os juízes e árbitros, para as questões de ciência, portanto, doutrinárias, e como tal, deverão apreciar, de forma imparcial e independente, a validade ou não de uma determinada doutrina a um caso em concreto.
Ressalta-se que o controle da validade de uma doutrina, pode ser feito pelos louvados expertos, valendo-se apenas de uma testabilidade para um caso concreto, que seja o objeto controvertido da lide.
Um perito apreciará as razões da validade científica e da aplicabilidade de uma doutrina sobre determinado pedido, uma vez que ele exerce a função de especialista, ao se deparar com a situação de antinomia entre doutrinas, motivo pelo qual, deverá observar o ceticismo profissional ao realizar o controle de asseguração contábil, já que os argumentações, tese e antítese, são, por excelência, matérias de ordem científica contábil.
Convém salientar que a independência de juízo científico dos peritos, deverão, sempre, serem respeitadas em todo e qualquer litígio.
Acrescente-se, ainda, que, somente terão legitimidade para promover o controle da validade de uma doutrina contábil, aqueles peritos especializados no assunto, e devidamente registrados no CRC, dentre os quais, é logico que não se incluem os leigos, os advogados e os litigantes.
É corolário[3] à análise científica, um método científico, tal como o do raciocínio lógico contábil, para se obter a supremacia do exame pericial como uma das vigas mestras de um laboratório de perícia forense-arbitral.
Dito isto, resta apreciar as consequências do descumprimento de tal dever.
Um labor pericial, que não aprecia as questões de ciência, poderá ser considerado inconclusivo ou deficiente, ou que falta ao perito o conhecimento científico necessário, nos termos do § 5o do art. 465, ou do inciso I do art. 468, ambos do CPC/2015.
Um juiz ou árbitro, que decide em sentido contrário a um pronunciamento de um perito especialista de área da ciência, por ele nomeado, que tenha enfrentado uma questão doutrinária, com uma análise científica, método científico, testabilidade e asseguração, estará decidindo em sentido contrário ao da ciência. Naturalmente um juiz, pode decidir contra o conteúdo de um laudo, quando há elementos, convincentes, contrários às conclusões periciais, como pareceres técnicos, e testemunho técnico, que refutam a conclusão da perícia. Apesar de que, para esta refutação de um laudo, o refutador crítico, tem que possuir um laboratório, ter feito testes, e comparação de resultados e se houver divergência doutrinária que possa implicar em mais de um caminho válido, deve indicar as fontes desta análise crítica e as razões de seu convencimento no sentido contrário ao do perito do juiz, identificando e provando precisamente as falhas do exame do perito do juiz.
Uma posição, ou laudo pericial, que no nosso entendimento, contraria um dever científico, isto é, sem a realização da imprescindível análise científica para a validação ou rejeição de uma doutrina, é nula, já que essa é a sanção por falta de conhecimento científico, cominada no inciso I do art. 468 do CPC/2015. Essa previsão de destituição do perito e devolução dos honorários, decorre diretamente da postura que se espera de um perito, um conhecimento notório e especializado sobre a questão envolvida na perícia, prescindindo de qualquer previsão explícita na lei, de que a doutrina é uma questão de análise pericial, mas que merece uma crítica, visando à apreciação dos fundamentos aqui utilizados em defesa da posição ora adotada por este signatário.
Concluímos que não teria cabimento, o afastamento das questões doutrinárias científicas contábeis do labor pericial, que deverão ser grafadas em laudos proferidos, com base em um juízo de ponderações, derivada da lógico difusa, de análises científicas e testabilidade efetuados em um laboratório de perícia.
O uso de evasivas por parte de um perito, para justificar a sua recusa ao enfretamento das questões vinculadas à literatura contábil, é no mínimo desproporcional a sua função.
Portanto, tanto o perito do juiz/árbitro, como os indicados pelos litigantes não podem esquivar-se da apreciação das questões de ciência, motivo pelo qual, devem os peritos desempenhar o controle dos testes de validade, evitando a nulidade de uma perícia que acarretará em prejuízo para a justiça e litigantes.
E por derradeiro, aos peritos, como guardiões da paridade de armas científicas e do contraditório e ampla defesa técnica e científica, incumbe apreciar o conteúdo das doutrinas, sempre que está se verifica necessária, em razão dos procedimentos e princípios da análise científica independente de pedido expresso de uma ou ambas as partes.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.
HOOG, Wilson A. Zappa. Laboratório de Perícia Contábil Forense-arbitral. Curitiba: Juruá, 2017.
[1] Um estudo específico sobre análise científica, procedimentos, princípios à luz de método científico, podem ser encontrados na literatura específica: HOOG, Wilson A. Zappa. Laboratório de Perícia Contábil Forense-arbitral. Curitiba: Juruá, 2017.
[2] A lógica difusa é uma forma de lógica multivalorada, tomou-se notória, em 1965 com a proposta da teoria de conjuntos difusos de Lotfi A. Zadeh que é considerado o "pai" da teoria da possibilidade. Cientista matemático e pesquisador na universidade da Califórnia, 1921 a 2017.
[3] Diz-se para a categoria “corolário”, toda situação ou resultado, que ocorre a partir de outros por extensão. Como um exemplo acadêmico, temos, em relação ao lucro da operação, uma despesa financeira aumenta a potencialidade da probabilidade do fundo de comércio; e a receita financeira diminui a potencialidade da probabilidade do fundo de comércio. Logo, é o que resulta dessa situação (despesa ou receita); que é uma consequência, pois nem sempre um rédito positivo ou negativo, tem por corolário a valorização do intangível fundo de comércio, pois a verdade, que é consequência, pode ser outra. Corolário é uma proposição criada ou nascida a partir de uma outra proposta, anteriormente demonstrada, onde um fato ou um conhecimento seja a ela acrescentado. Desta forma, é uma ação de continuar um pensamento científico, como uma derivação de um raciocínio.